Ao pensar sobre verdade ou mentira, me apresso em mudar de pensamento. Não seria adequado “verdade ou mentira”, pois essas são duas coisas que vivem juntas, se completam e se justificam sempre. Sendo assim, mais apropriado seria: Ao pensar sobre verdade e mentira, chego à reconfortante conclusão de que não há quem exista “de mentira” e nem aquele que viva “em verdade” para si mesmo.
Primeiro ponto, a maior verdade que cada um traz consigo é a da sua própria existência. Deixemos de lado qualquer tendência aos conflitos existenciais e tomemos os fatos como base. A partir do momento em que nos reconhecemos como “eu”, assumimos uma postura perante o mundo e trazemos conosco uma verdade incontestável, somos quem somos, podendo isso significar que somos quem queremos ser ou quem acham que somos, mas somos e ponto. A partir daí qualquer coisa é contestável. Viver de verdade é redundante, pois viver, no sentido de estar vivo, já é a grande verdade.
Inclino-me a pensar que a vida, no sentido da vivência, seja a maior mentira. Passamos por toda nossa existência procurando meios infalíveis e tão frágeis de buscar a nossa verdade absoluta, a “não-finitude”. Pensando por esse lado, vivemos de verdade, buscando, mesmo que inconscientemente, o sentido da nossa vida em uma falsa verdade. Não haveria motivo algum para viver intensamente se não acreditássemos na nossa eterna mentira. Afirmar para si mesmo a existência do fim e se dizer conformado com isso é uma verdade hipócrita e eu, particularmente, prefiro a minha farsa reconfortante.
Que sentido faz viver, existir, num mundo que teve começo, portanto já não existiu e a tal estágio poderá retornar? Saber que tudo que se vive retornará ao temível pó, à própria terra, ao próprio mundo? Dá-se o sangue pela vida, sangue feito de nada, corpo feito de nada, que se acaba, vida que se faz e desfaz. Negar a crueldade de viver com prazo de validade é negar a nossa única saída para sermos alguém.
Penso que o sentido mais coerente para se viver é reconhecer que fomos feitos para o outro. Para nós não somos muito, viveríamos sem nós mesmos, mas não suportaríamos um segundo sem quem quer que seja.
Se escrevo é para que você leia, pois caso não fosse, não escreveria já que tenho conhecimento do penso. Se me escondo é para que não me veja, já que sei de tudo que há em mim. Se falo é para que escute, já que meus pensamentos não precisam de sons. Se escuto é para que você fale, já que não preciso me ouvir. Se choro é para que veja, pois eu sei sofrer sem lágrimas. Não abraço a mim mesma, não sou dona da minha felicidade, não invento o meu próprio sofrimento. E antes de tudo, sou quem sou por que me fizeram assim, um pouco de cada misturado com o nada que há em mim.
E a minha verdade é conduzida pela mentira reconfortante de viver, e sim, sou feliz assim. Não fui feita para mim, mas há quem tenha sido.